Wednesday, August 30, 2006

Circular

No ponto de ônibus um homem todo de preto pergunta pra senhora: Aqui passa o circular, dona? No que ela responde: Aqui, não. Só passa o retangular... - e um garotinho próximo aponta para o céu, perto do canto do sobrado, e diz: O circular passa ali - no que, um disco voador passa ali bem naquela hora. O homem de preto faz cara de decepção sofrida ao ver aquilo.

Friday, August 18, 2006

Áreas

Eles me pagam... Nunca invadi o território deles e os desgraçados vieram em bando. Agora estou aqui na beira da calçada, só esperando pra ver o que acontece. Não consigo me levantar, meu focinho está salpicado de sangue e perdi uns dentes. Botei eles pra correr, mas fiquei bem abatido. Estou velho. Talvez seja melhor fazer igual ao Bob, que sorri pra todo mundo, ganha a comida dele e deixa qualquer um passear na área dele... Aqui eu só tenho problema com os cachorros da praça, na frente do teatro. Um bando de cachorro sujo que já atacou até as crianças da praça. Ficam andando com vagabundo e aprendem a ser folgados... Aqui eu só corria atrás de carro, só pra mostrar que eu existia. Latia um pouco, ganhava meus restos no bar do carlinhos e dormia na ilha, nada de mais, não perturbava ninguém. Mas aqueles filhos da puta queriam brigar, vieram aqui e agora sou um monte de osso estragado no canto da calçada. O carlinhos me trouxe uma bacia de leite. Ele é legal. O Bob passa, me vê e vem falar. Fica triste, senta do meu lado um tempo mas logo volta pra área dele. Ele sabe o que vai acontecer. Eu também. Eu devia ter ficado na área dele, mas achava que ia ficar afrescalhado igual o Bob ou virar pastel. Nunca soube se essa história aconteceu alguma vez, mas que uns 2 camaradas meus sumiram na noite naquela área... isso é verdade.

Bom, enfim, chega o caminhãozinho. Foi uma mulher que ouviu a briga de noite e chamou. Me pegam com um laço e me jogam pra dentro. Agora eu sei que nunca mais vou ver o Bob nem a rua nem os cachorros da rua de cima.

Tuesday, August 08, 2006

Azulejos

Quis chegar um tempão antes para ver quem chegava antes dos outros. A loja estava ali quieta e domingo não costumava acontecer nada, nem abria, mas o pessoal do centro disse que ia aparecer o belzebú ali dentro daquela loja. Eu sempre acreditei em tudo que a mãe Camoema falava, e minha curiosidade não deixou eu ficar longe da loja. Acontece que ela falou que isso ia ser na parte da manhã, mas já eram quase 11 horas e agora eu comecei a perder minha esperança de ver o satanás. Também, que besta, para que ver aquilo? Que coisa boa lúcifer poderia me trazer?
A porta da loja começa a se abrir às 11:30 deixando sair muita fumaça. Um ser de cabeça de bode e terno de lantejoulas sai de lá com um microfone na mão anunciando o único, o inominável, o diabooo!! E algumas pessoas que estavam passando na rua resolvem parar para ver. E do meio da fumaça, com várias luzes brincando na sua passagem, sai o próprio demo. Um terno impecável, andar malandro, seu rosto era como o de um búfalo. Começa a cantar. O ritmo é alucinante e sua banda, dentro da loja, ataca um naipe de metais que arrepiava os ossos. Não dava pra ficar parado. A rua inteira dançava. De sua boca, palavras que ninguém entendia, mas que soavam familiares, como se já tivessem sido pronunciadas antes de nascermos. E o pessoal foi andando, dançando. A mulherada exibia suas tetas. Um piano agulhava cada nervo dentro do ouvido. O coisa-ruim tinha um balanço incrível. Aos poucos fomos entrando todos na loja. Fui o último a entrar, depois a porta fechou, eles sumiram e assim que viemos parar aqui dentro, seu guarda.
- Tá bom. Agora vem com a gente contar isso na delegacia.